ACTAS  
 
06/09/2014
Simulação de Assembleia: Legalização da prostituição
 
Joana Barata Lopes

Muito boa tarde, vamos dar início à sessão plenária de hoje.

Quero cumprimentar os senhores deputados, os senhores membros do Governo.

No primeiro ponto da ordem de trabalhos temos a legalização da prostituição. Toma a palavra o Ministro Tomás Roque da Cunha, pelo Governo Bege. Tem 5 minutos.

 
Tomás Roque da Cunha

Exma. Senhora Presidente da Assembleia da República

Exma. Senhora Primeira-Ministra e demais membros do Governo

Senhoras e Senhores Deputados

 

Intitulada a mais antiga profissão do mundo, a prostituição vive em Portugal um vazio legal.

Na opinião do governo bege, esta situação tem de ser revista com o objetivo de alcançar dois pressupostos principais: a questão do respeito pela pessoa humana e a da saúde pública.

 

Relativamente à prostituição, não existe qualquer sanção jurídico-penal. Em relação a este tema, a nossa opinião pública perde-se ou em questões de falsas morais ou em questões de autodeterminação sexual.

 

E perdemos todos nós. Perdemos ao abrir caminho ao crime organizado que, através do tráfico humano, leva muitas vezes à imigração ilegal. Perdemos também ao permitir o crescimento de problema gravíssimos em termos de saúde.

 

Perante este enorme problema, o governo bege decidiu agir. Ao contrário de outros que assobiam para o lado quando confrontados com estes problemas, nós decidimos agir.

 

Podemos não ter a solução perfeita mas, ao contrário de outros, não nos guiamos pela frase de Aristóteles que diz: "há apenas uma maneira de evitar críticas – não faça nada, não diga nada, não seja nada”.

 

Nós não temos medo das críticas. Nós agimos.

 

O principal problema da prostituição não é a prostituição em si mesmo mas sim os problemas que com ela vêm.

 

É por isso que agimos: para diminuir ou extinguir esses problemas. Para isso apresentamos medidas concretas. Não um mero conjunto de ideias vagas ou princípios. Não! Nós temos medidas concretas.

 

São elas: criar legislação que restrinja o acesso à profissão de acordo com critérios sanitários e etários; aumentar o combate ao proxenetismo; criar condições tributárias e de segurança social idênticas às dos outros trabalhadores; criminalizar as vitimas de tráfico; criar um fundo, através da segurança social, que – sob a forma de um subsídio, apoie a saída desta profissão.

 

Para além disso, e de forma a sensibilizar a população portuguesa para esta temática, criaremos um programa de esclarecimento.

 

Digo-vos, desde já, que caso queiram, aprofundaremos qualquer uma desta medidas. Estaremos completamente disponíveis para isso no período de respostas.

 

Com estas medidas, baseadas em estudos realizados na Universidade de Standford, acreditamos que vamos reduzir o proxenetismo e diminuir os problemas graves de saúde que são provocados por estas atividades.

 

Esta reforma, apesar de todos os fundos que vamos disponibilizar para a saída da profissão, tem um impacto positivo no Orçamento de Estado.

 

Dirão os "velhos do restelo”, os mesmos de sempre, que estas medidas são o apoio a uma imoralidade ou vão provocar o aumento da prostituição. O que lhes pergunto é simples: será mais imoral o exercício da prostituição’ em condições sanitárias de excelência ou, pelo contrário, em sítios onde abundam as doenças sexualmente transmissíveis?

 

Será mais imoral atacar o proxenetismo e o tráfico humano ou, pelo contrário, deixar andar e negligentemente permiti-los?

 

Em relação ao aumento da prostituição: terão os senhores algum problema com a prostituição em si? Querem criminalizá-la, aumentando assim o número de presos em Portugal? Não me parece, devido ao deserto de ideias e de propostas destas bancadas sobre este tema.

 

Concluo então que os vossos problemas são da mesma origem que os nossos. O problema é com as atividades relacionadas com a prostituição e não com a mesma.

 

Se sim, se são realmente esses os vossos problemas, analisemos a mudança que esta lei provoca. O proxenetismo irá aumentar ou diminuir? As doenças sexualmente transmissíveis vão aumentar ou diminuir? Os problemas relacionados com drogas neste meio vão aumentar ou diminuir?

 

Na minha opinião diminuem.

 

E os apoios às prostitutas que querem abandonar a profissão aumentam ou diminuem? Na minha opinião aumentam.

 

Para concluir, senhora presidente e senhores deputados, penso que se torna claro que este pacote de medidas resolve os problemas mais graves relacionados com a prostituição e espero que os senhores deputados deixem por uma vez as querelas partidárias de lado e que nos ajudem a aprovar esta reforma.

 

Obrigado.

 

[APLAUSOS]

 
Joana Barata Lopes
Tem a palavra, por três minutos, a deputada Mafalda Oliveira Gomes, do Grupo Parlamentar Castanho.
 
Mafalda Oliveira Gomes

Exma. Senhora Presidente da Assembleia da República

Exma. Senhora Primeira-Ministra e demais membros do Governo

Senhoras e Senhores Deputados

 

A primeira conclusão que tenho de retirar do vosso Programa de Governo é que os senhores membros do Governo não tiraram o proveito máximo do ensino primário, visto que foram incapazes de analisar e até de escrever com correção ortográfica.

 

[APLAUSOS]

 

Refiro-me naturalmente à quarta medida proposta, onde propõe não só a criminalização de uma conduta que já está criminalizada como, caso precisem de explicações para escrever "criminalização” eu estarei disponível para esse efeito.

 

Este programa afigura-se-me infeliz tanto do ponto de vista jurídico como social.

 

É certo que a prostituição não constitui crime mas isso não significa que seja aceite pelo Direito, não significa que seja uma conduta lícita.

 

Portanto, o segundo conselho que deixo aos membros do Governo é que façam uma pesquisa sobre o tema que se propõem legislar, percam algum tempo, porque o nosso ordenamento jurídico não permite a celebração de negócios contra a moral pública ou os bons costumes.

 

Vozes

Muito bem

 

A Oradora

Mais importante do que analisar esta proposta sob o ponto de vista jurídico, é analisar as nefastas consequências que a legalização da prostituição pode acarretar.

 

Falo da associação direta ao tráfico humano – preocupação naturalmente expressa nos vossos objetivos estratégicos, mas que não está concretizada em nenhuma medida concreta apresentada pelo governo.

 

Não sei se os senhores sabem mas 62% das mulheres traficadas são vítimas de exploração sexual. Assim, esta legislação abriria portas a que mais mulheres fossem exploradas sexualmente.

 

A prostituição é uma forma de violência principalmente sobre mulheres e, como tal, constitui um obstáculo contra a igualdade de género. E note-se que o valor da igualdade é constitucionalmente protegido.

 

A prostituição traz a ideia de que o corpo da mulher está à venda: isso é inadmissível e entra em colisão direta com o valor da dignidade humana. Curiosamente, outro valor constitucionalmente protegido.

 

A conclusão que se impõe retirar a todos nós é que este governo só pretende proporcionar a todos os portugueses um futuro pior.

 

Muito obrigada.

 

Vozes

Muito bem

 

[APLAUSOS]

 
Joana Barata Lopes
Muito obrigada. Para outra interpelação ao Governo, tem a palavra agora o senhor deputado do Grupo Parlamentar Cinzento, Rodrigo Ataíde. Dispõe de três minutos.
 
Rodrigo Ataíde

Exma. Senhora Presidente da Assembleia da República

Exma. Senhora Primeira-Ministra e demais membros do Governo

Senhoras e Senhores Deputados

 

Em primeiro lugar, eu gostaria de começar por subscrever aquilo que a deputada Mafalda Gomes referiu.

 

E queria começar por lhe interpelar fazendo-lhe uma questão: você gostaria – o ministro que propôs este absurdo programa de governo, que algum dos seus filhos fosse um profissional do sexo?

Eu não gostaria. Há várias profissões que eu gostaria que os meus filhos tivessem mas se fossem profissionais do sexo eu tentaria demovê-los disso.

 

E aposto que nesta assembleia todos dirão a mesma coisa. Portanto, não sei, se tiver uma opinião diferente, será legítimo.

 

 

Vozes

Muito bem

 

O Orador

Em segundo lugar, gostava de ler a noção que a ONU deu de prostituição. De acordo com a ONU, a prostituição compreende um processo em que as pessoas, mediante remuneração, de maneira habitual, sob quaisquer formas, entregam-se a relações sexuais, normais ou anormais, com pessoas do mesmo sexo ou do sexo oposto, durante todo o tempo. Entende-se que a prática sexual comercial é como qualquer ato comercial em que dado valor seja recebido por alguém.

 

Ora isto leva-se a algumas considerações.

Se considerarmos que a prostituição é uma transação comercial, ela estará ao abrigo da lei da oferta e da procura.

Não será isto uma banalização do ato sexual?

 

 

Vozes

Muito bem

 

[APLAUSOS]

 

O Orador

 

Nós, portugueses, somos uma sociedade que está erigida sobre o amor. As nossas lenda, as nossas tradições, todas contam histórias de amor. Vejamos a da "Boca do Inferno”, a da Dona Inês de Castro e de D. Pedro, Frei Luís de Sousa, Camilo Castelo Branco e Ana Plácido.

Ora, não será esta uma mudança radical que altera a forma como a nossa sociedade vê o amor e o sentimento pela pessoa?

 

Eu considero que sim e nenhuma reforma a nível social poderá trazer alguma coisa de bom à nossa sociedade.

 

[APLAUSOS]

 

Após esta análise, tenho algumas considerações a fazer à proposta que me entregaram. A minha colega já referiu a da criminalização, mas depois temos uma coisa que eu acho que é inconstitucional: a vossa proposta discrimina sexos.

 

No vosso segundo ponto referem que pretendem "melhorar as condições de trabalho e de saúde pública dos profissionais do sexo, dando às mesmas (...)”. Ora da última vez que vez que verifiquei, "as mesmas” são mulheres.

 

Vozes

Muito bem

 

[APLAUSOS]

 

O Orador

Ora há entre os profissionais do sexo tanto mulheres como homens.

 

Outra proposta vossa refere a atribuição de um subsídio da Segurança Social. Isto não é um incentivo à prostituição?

 

Muito obrigado.

Tenho dito.

Vozes

Muito bem

 

[APLAUSOS]

 
Joana Barata Lopes
Para responder a ambas as interpelações, tem a palavra o Ministro António Coutinho.
 
António Coutinho

Exma. Senhora Presidente da Assembleia da República

Senhoras e Senhores Deputados

 

Eu gostaria de dizer que, antes de mais, a nossa proposta implica o respeito pela pessoa humana e a liberdade de escolha da mesma.

Cada cidadão é livre de escolher a sua profissão, de fazer as escolhas sexuais e dispor do seu corpo como entender.

Deveremos nós julgar se esta profissão é fácil ou difícil? Ou devemo-lo permitir, se for exercida livre e voluntariamente? Evitando assim o abuso e a violência sexual.

 

Depois referiram o trafico humano. Como o meu colega de governo referiu, a prostituição é a profissão mais antiga do mundo. Acham que vão mesmo conseguir com que ela acabe? Ou devemos permitir que ela seja feita em segurança?

 

Como combater o problema do tráfico humano e imigração ilegal: neste momento, 57% das prostitutas que estão no nosso país são ilegais. Nós apresentamos uma medida para combater a imigração ilegal. Tendo em vista este combate, devemos pedir ao SEF que toda e qualquer profissional que entre no nosso país para desenvolver esta atividade apresenta um visto de permanência temporária em Portugal, referindo a sua intenção de ingressar na carreira profissional do sexo.

 

Nesse período devem, para o devido efeito, apresentarem-se com a regularidade a estipular junto das autoridades competentes enquanto o visto definitivo não esteja emitido.

 

Depois temos a questão do fundo da Segurança Social. A criação deste fundo serve para ajudar toda a qualquer profissional do sexo que queira sair desta vida.

 

Com a legalização, iremos descobrir pessoas que não estão nesta atividade de livre e espontânea vontade. Provavelmente associadas a redes de tráfico humano. Porque acima de tudo nos interessam os direitos humanos, queremos possibilidade um caminho de saída.

 

Vamos receber um rendimento fiscal através desta atividade, como é óbvio, que permitirá que não estaremos a comprometer o dinheiro dos contribuintes.

 

Países mais avançados neste domínio: a Suécia. Lá, onde esta lei foi muito polémica, começaram por questionar a "veracidade” da lei. Passados 5 anos, o número de profissionais do sexo nesse país decresceu em 60% e o número de clientes em 80%.

 

É este o modelo que queremos seguir, é neste modelo em que acreditamos.

Obrigado.

 

[APLAUSOS]

 
Joana Barata Lopes

Muito Obrigada.

 

Terminámos o primeiro debate. Queremos agradecer a todos a boa utilização do tempo. Vamos agora passa à votação. Os grupos participantes não votam e os restantes votam naquele que consideram que ganhou o debate.

 

Quem considera que o Governo ganhou o debate levante o cartão de voto.

Quem considera que a Oposição 1 ganhou o debate levante o cartão.

Quem considera que a Oposição 2 ganhou o debate levante o cartão.

O debate foi ganho pela oposição 1, pelo Grupo Castanho.

 

[APLAUSOS]

 

Vamos à segunda votação, sobre a substância do tema. Quem entende que a legalização da prostituição deve ser concretizada?

Quem tem a opinião contrária?

Alguém se abstém?

 

42 votos a favor, 39 contra.

 

Passo agora a palavra ao nosso painel de comentadores.

 
Dep.Carlos Coelho

Primeira questão: eu não concordo com a vossa votação. Para mim, quem ganhou de forma clara foi a oposição 2, o Rodrigo foi o melhor orador nesta sessão.

Sem qualquer dúvida para mim. O Rodrigo só cometeu um erro, a utilização do "vocês”.

O "você” é um termo proibido no quadro parlamentar. Diz-se "senhor deputado” ou "senhora”. "Você” é um termo coloquial que se usa na rua mas não dentro do parlamento.

O Rodrigo teve uma excelente modulação de voz, foi o único orador que o fez. Jogou com a voz para dar ênfase às suas opiniões. Teve bons argumentos, excelentes argumentos.

 

Aquela dos "seus filhos” esteve no limite do que é aceitável, esteve muito bem porque disse que "outra opinião também é legítima”, não fazendo um discurso moralista.

 

Citou a ONU, esteve muito bem.

 

O Tomás esteve muito bem na intervenção inicial. Fez um discurso muito articulado. Sobretudo, transmitiu convicção e seriedade. Jogou bem com as mãos, fê-lo de forma correta.

O que foi que fez mal? Três coisas: primeiro, cuspiu para o microfone; segundo, deitou-se para a frente, debruçando-se sobre o microfone; e depois, faltou umapunchlineao Tomás. Isto é: o discurso foi muito articulado, bem fundamentado. Aliás, quer o Tomás quer o António na fase final se agarraram a uma linha argumentativa bem feita que é a lógica da saúde pública, mas faltou umpunch, algo que desse um murro nos argumentos, que transmitisse uma convicção forte.

 

O Tomás esteve bem em termos de seriedade mas não deu o pulo para rebentar em termos de convicção.

 

Todos vocês estiveram bem sob o ponto de vista do cumprimento dos tempos.

 

A Mafalda o que tem de melhor é o sorriso. Isto não é uma referência machista. Fez um discurso muito escorreito, mas sem modulação de voz. Se eu quiser responder à pergunta qual foi o momento com mais força da sua intervenção, que equivale ao sublinhado no texto escrito, não teve nenhum. Todo o discurso foi no mesmo registo.

 

E utilizou na fase final um bom argumento: a questão da dignidade humana. Foi a melhor parte do seu discurso. Eu teria terminado com isso, em vez de terminar com aquela fórmula coxa "com este governo não há futuro”.

 

E o governo, com este argumento forte da dignidade humana, devia ter respondido melhor dizendo que a melhor forma de defender a dignidade das pessoas é com a legalização da prostituição.

 

Aquilo que vocês fizeram de melhor, embora o António não o tenho feito assim tão bem, foi terem dado exemplos.

O António, dando o exemplo Sueco, cometeu um lapso dizendo "veracidade” em vez de "viabilidade”.

 

Mas foi bom terem dado exemplos concretos: o Tomás com a Universidade de Standford, o Rodrigo citando a ONU e o António com o exemplo sueco.

Não há nada mais pedagógico que o exemplo concreto, trazendo factores de autoridade para a discussão.

 

De uma forma geral, acho que todos estiveram bem. Foi um muito bom exercício. Eu não concordei com a vossa votação mas ela é soberana e, para todos os efeitos, quem ganhou o debate foi a Mafalda.

 
Duarte Marques

Obrigado a todos. Eu também concordo com aquilo que o Carlos Coelho disse. Também acho que foi o Rodrigo que ganhou o debate.

 

Acho que o Tomás vinha bem preparado, foi muito articulado. Já no final prejudicou-se a falar muito próximo do microfone. Tenham a noção de que têm de se afastar do microfone. Mesmo deputados experientes têm esse vício.

 

Ele disse várias vezes "na minha opinião” e "na opinião do governo”. O António disse uma vez "o meu ministro”, quando deveria ter dito "o senhor ministro”.

 

Foi inteligente ao chamar a oposição para discutir mas foi prejudicado pela parte final em que teve de acelerar um pouco para terminar.

 

A Mafalda foi muito sacaninha com a história do erro. E foste pouco política no resto. Tentaste enlear isto com argumentos jurídicos (deves estar a estudar Direito) e foste pouco política no resto. Foi aí que o Rodrigo foi mais forte.

 

Tu foste "sacaníssima” a usar o argumento do erro e ele depois foi inteligente a voltar a usar essa argumento contra eles, obtendo uma salva de palmas com uma coisa que tu já tinhas dito.

 

Ele foi mais político a desmontar a proposta. Usou sentimentos, jogou com as pessoas e casos pessoais, pôs-se no papel das pessoas. Acho que foi inteligente com isso.

 

O António tentou ser sério no debate, usou o argumento da saúde pública, mas perdeu-se um pouco na parte final. Ele tem uma voz que eu gostava de ter.

 

Deixem-se com contar esta história: uma vez fiz um debate sobre esta matéria com uma senhora do PS e uma senhora "da vida”. No final a senhora "da vida” despediu-se de mim dizendo: "sempre que precisar”, disponha.

 

[RISOS E APLAUSOS]